segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Quando souber te digo (Regina rainha 2)

Meu desejo era encontrar peixe, porém num sábado não tenho feira livre aqui por perto. Mesmo assim saio nessa jornada inglória ando de um lugar à outro e nada que me interesse, até que  passo pela porta de um bar que já havia passado na calçada por centenas de vezes e nunca o havia observado com a devida atenção merecida.

Na sua entrada duas mesas uma em cada de suas extremidades como duas sentinelas bebedoras. Uma mulher velha (acredito eu ) já desprovida de seus hormônios dominantes com traços e trejeitos masculinos e na outra ponta um homem também velho desprovido (acredito eu) de seus hormônios dominantes também com  traços e trejeitos femininos. Me espantei indagando-me que lugar seria aquele com aqueles guardiões? lembrei-me dos leões alados protetores das entradas dos templos da antiga mesopotâmia das gárgulas guardiãs, no alto das fachadas de algumas catedrais. Resolvi então entrar e conferir aquele lugar emblemático.
Passo pelas duas entidades porteiras, avanço alguns seis passos me deparando com três mulheres no caixa do bar. Duas tipo negras claras de cabelos indígena tipicas nordestinas sorridentes e receptivas e a terceira (a dona) uma Chinesa lépida e de uma simpatia incomum aos chineses donos de bar, que com forte sotaque falava o Português sem nenhum medo ou constrangimento: 16 "leais come a vontade até caine". Com um rádio transmissor pendurado no pescoço falava com seus cozinheiros ordenando que abastecessem a gôndola como mais comida: Tá faltando salada, pastelzinho, linguiça e "alois".

Sim meus amigos um restaurante à quilo com comida brasileira e bem temperada,feita por nordestinos do forrobodó (aqueles que não escondem que são nordestinos), sob a batuta de uma risonha e descarada chinezinha.
Eu tinha que conviver um tempo ali pra poder observar aquele lugar improvável e provavelmente louco. Fiz um pratão do tipo pedreiro (pedreiro-food) e lentamente fui comendo  aquele cenário surreal que começou a desfilar para meus olhos.
Como já disse era sábado além de feijoada tinha uma variedade enorme de comida percebi que o prédio em cima de nós é uma grande torre de kitchnets entre a Amaral Gurgel e Praça da república. As mesas estavam quase todas lotadas: Entregadores das casas bahia e magazine luíza, mães com suas crianças, porteiros, domésticas, mulheres de comportamento indefinido e muitas muitas travestis com seus maridos, moleques de canela fina com cara de manos de periferia.
Pedi uma tubaína pra acompanhar minha ceia antropofágica. Os trabalhadores braçais também tomavam tubaína de uma de suas mesas me saudaram. Identificação talvez? Reparei que marido de travesti não toma tubaína,todos tomavam coca cola ou fanta uva (algo interessante pra algum teórico pesquisar, não?). 
Uma fila gigantesca se formou no balcão da comida. Percebi que havia uma promoção: Deizão pra você conseguir lotar a marmita desde que ela feche. Um negócio da China. Os cozinheiros estavam fora da cozinha acompanhando tudo pra que nenhum espertalhão tentasse enfiar só "carne" na quentinha, comentavam safadezas e riam-se muito. O lugar estava efervescente e alucinado e eu ouvia: Regina quanto tá a marmita? Regina quanto eu pago? Regina acabou o frango. Regina tem maionese? Regina , Regina, Regina Regina...
Eu já enlouquecido só queria saber quem era essa tal de Regina tão requisitada. Foi aí pra minha estupefação e vontade de chorar de rir que descobri que Regina é o nominho no qual todos chamam a chinezinha sorridente e descarada, maestrina daquele lugar tão familiar e profano. Pus-me a pensar que o nome (verdadeiro/chinês)dela talvez seja algo com sonoridade parecida de genitália brasileira.
 Que a comida de Regina nos alimente em tempos de fome de poesia e alegria. Que a comida de regina nos traga sobre-vida. Que a comida de Regina nos eleve aos orgasmos. Que a comida de Regina não nos esqueça nas esquinas. Que a comida de Regina desmonte nossas mesquinharias. Que a comida de Regina nos livre de toda baixaria. Que a comida de Regina seja mais fina que você minha filha. Que a comida de Regina ultrapasse a mais valia. Que a comida de Regina se torne idolatria. Que a comida de Regina não te cause embolia. Que a comida de Regina ritme essa sinfonia. Que a comida de Regina não falte nos seus dias. Que a comida de Regina te pegue no canto da pia. Que a comida de Regina devore a maçonaria. Que a comida de Regina nos traga melhores dias. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário