segunda-feira, 26 de setembro de 2011

O cheiro

                Por que não falar do cheiro daquilo que desagrada e pode ate feder?
                 Quando cheguei na cidade grande percebi a poluição da fumaça dos carros e fabricas, como algo que me roubava o olfato, nos colocando em rota para um talvez futuro câncer, onde não era possível sentir nem nosso próprio cheiro.
                  Mas mesmo assim atrevo-me a falar de cheiros, o cheiro de uma dama da noite, e me refiro a árvore e não as prosti-trava- mulher de programa.
                  O cheiro de merda e urina das calçadas, infectas e invisíveis assim como seus moradores, o impossivel cheiro das chaminés e escapamentos que cingem nossas casas com um pó preto, fuligem ,que nos assusta quando imaginamos tudo aquilo em nossos pulmões.
                   Sendo tomados por um medo de uma morte intranquila e sofrida.
                   O cheiro do amanhecer acompanhado do cantar de pássaros que mesmo de um prédio fétido da cinza São Paulo, pode ser ouvido.
                    Do som não vou falar, pois não  foi isso que me propus.Mas sim do cheiro que pode ser maravilhoso e grandiosmente sublime nessa prosa sensorial.
                     Pra que todos vejam, ouçam e principalmente sintam aquilo tudo que possa aumentar suas vontades.
                     Tão boa é aquela comida que antes de pronta te entorpece de salivas para come-la.
                      O oposto também ocorre, quando de uma pessoa que deseja muito devora-la, e só quando consegue o privilégio de ter com ela, seu cheiro lhe desagrada totalmente, insatisfação e impotência que nem o mais renomado filósofo te instruiu, nos seus anais.
                       Sempre acreditei numa experiência própria, libertaria e suficientemente anárquica para conviver e viver com as mais aberrantes diferenças, e que isso me libertaria de qualquer tipo de grilhão olfativo. Mas sou obrigado admitir, que não alcancei toda essa liberdade.
                       O cheiro do seu  sexo me agrada desde que bem lavadinho.
                       O cheiro das putas da Rua Augusta e muito doce, o cheiro dos michês da Rêgo Freitas reserva surpresas, o cheiro dos artistas plásticos na bienal é impictório, o cheiro dos atores da Pr. Roosevelt se esvazia em tédio,o cheiro das travestis da Epitácio Pessoa mente tanto quanto seus pintos escondidos entre as pernas(neca aquendada), o cheiro dos meninos e meninas da Vila Olímpia e Moema denunciam o cheiro de uma elite, rica, desnecessária,vazia,  demoníaca e (como todo o resto) colonizada.
                         Sobre o cheiro da colonização, nossa, o fedor dos piratas, marinheiros,dontarios de terras e escravos, europeus que tão amorosa e piedosamente nos inventaram. Não foi suficiente para que não fecundassem nossas índias e negras de aromas e cores, que não farejando acabaram por serem presas.Presa fácil! Daquilo que não queríamos ser, ou  se possível não seriamos.
                          O cheiro. Não suporto seu cheiro, cheiro de cece, de chulé, de rabo  sujo, de buceta suada, de pau não lavado, de cabelo ensebado, de resto de comida removido do vão dos dentes, do odor de enxofre de algumas pessoas sombrias, do cheiro de peido das almas sebosas, O mal odor de um tipo de gente que não ama nem respeita.
                           Mas acima de tudo odeio um certo cheiro de uns que se sentem superiores a tantos outros.


                                                        Pedrão Guimarães

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

XiXi darwinista

  1.     Esta proibido fazer xixi em público em banheiro público!

          Parece uma contradição ilógica, ou uma frase mal construída, mas trata-se da mais pura realidade.
          Pelo menos em São Paulo. Dos banheiros públicos, foram tirados os cochos de urina e os urinóis coletivos.
           Em nome de que teria isso acontecido? 
Da globalização?
Da higiene?
Do fim do constrangimento dos que não são bem dotados?
Do fim do hiper-exibicionismo dos que são bem dotados?
Do apelo de alguma instituição religiosa?
Da caça ao demônio?
Da luta contra a pederastia?
Do fim dos atos obscenos em publico (pegação)?
Da moral e dos bons costumes?
Existe moral e bons costumes dentro de um banheiro público masculino?
             Ninguém pode culpar a cidade por tentar!
              Hoje todos estes antros (para alguns santuários), estão divididos em cabines individuais, seguindo a tendencia mundial de individualização cada vez maior de tudo a nossa volta.
               A ideia de civilização passa pelo principio de isolamento  cyber-burguês, usar um banheiro público tornou-se algo tão seguro e prazeroso quanto teclar sua internet no quadradozinho da sua lan-house, o dificil é saber onde se produz mais merda.
              Se bem que esta  medida excludente e proibitiva, acabou criando o seu proprio infortunio , os homens de rua foram os maiores favorecidos com essa compartimentalização dos banheiros, pois os quadradinhos acabam por lhe servirem também de lugar para dormir em sossego, no meio do "fedô", mais em sossego, isso mostra que o ser humano consegue driblar a própria adversidade humana e neste ponto reside o mais curioso desta ridícula farsa.
             Todo mundo se preocupa com o futuro do planeta sem abrir mão de seus confortos individualizados; mas as práticas individualizadas não aumentam  o consumo de água e luz por exemplo?
               De onde vamos tirar mais recursos da natureza do planeta para manter nossos aparelhos ligados e bidês funcionando.
                Faça o que digo mas não faça o que eu faço! Odiava ouvir isso quando criança. E hoje observo que este provérbio é a  grande máxima da terra, o véu da hipocrisia  cobre a decomposição que impulsiona o que chamamos de evolução.Até quando dois pesos e duas medidas.           
                Será que só conseguiremos mudar quando formos tomados de assalto por uma grande asfixia?
               Se não conseguimos nem mais mijar em público em banheiro público, como então criar desenvolvimento sem destruição?
                                                            Pedro Guimarães

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

República dos gabirus

República dos Gabirus

(Para o grande e desparecido amigo Mauro)

       Vivo me perguntando, se não teria sido melhor se não houvesse estudado? O que é o pior tipo de cegueira? Não compreender o que está a nossa volta? Ou enxergar demais? Sofro de visão excessiva. Não sou pedante não! Sou sociólogo! 
         Me vejo todos os instantes do dia convivendo com os mais variados tipos de equívocos dentre pessoas de todas classes sociais e etnias. E isso faz com que eu muitas vezes me apresente com uma postura distante com certos ares de uma arrogância que posso jurar que não tenho, inclusive a própria opção de estudo que fiz mostra o quanto me interesso e me agrado com a idéia de poder pensar formas para modificar a condição de vida das pessoas, tornar o país e o mundo mais justos.
         Mas, quanto mais me debruço sobre leituras e idéias a cerca da mudança mais me angustia as contradições que saltam-me aos olhos e a mente, parece que nunca seremos capazes de elaborar modelos de sociedade que assegurem um melhor viver e isso constitui em mim uma dor incomensurável, mas ao mesmo tempo também me impulsiona a continuar buscando soluções para destruição das injustiças. 
         Regras e métodos estiveram sempre presentes em minha vida desde muito cedo, sim, quando menino ajudava meu pai em um botequim cheio de bebida barata e estivadores que ali encharcavam seu modo de vida simples na cachaça, nenhum dos meus outros irmãos gostava de ficar no bar, tinham vergonha de serem vistos ali pelos seus amigos de famílias abastadas; eu, no entanto não ligava.
          Tinha uma melhor mesada de nosso pai por ajudá-lo, gostava de ir ao cinema e de andar a cavalo no sítio de um tio nosso.Na adolescência fui trabalhar em banco coisa que foi um orgulho para família, ambiente disciplinador de repetições contínuas, mas que na época fazia sentir-me ótimo, até mesmo pelo fato de não ter grandes questionamentos sobre política e nem capital.
          Quando passei no vestibular de sociologia vibrei bem mais que os demais familiares; que perguntavam como eu ganharia dinheiro com esse curso mais tarde, mesmo assim não conseguiram me desmotivar.
           Embora não soubesse direito o que era um sociólogo nem para que ele servia, abraçei essa nova perspectiva de vida e fui fazer meu curso.O curso descortinou um universo fascinante na minha frente. Toda a cultura alternativa, ideologias “exóticas”, seitas orientas, haxixe, experimentações sexuais e música transcendental passaram a fazer parte do cotidiano de um bancário aparentemente comportado e doutrinado, mas que só mais tarde viria a descobrir que represava um vulcão interno.
       Todo o experimentalismo pelo qual eu passava não me assustava, por incrível que pareça eu tão contido e convencional experimentava de tudo como se já houvesse vivido aquelas experiências, não sei se em sonho ou talvez em vidas paralelas? 
         Será que tudo aquilo era uma espécie de sina que se revelava, de forma tão natural que não me fazia em momento algum sentir assustado ou culpado. Essa idéia até hoje me perturba, mas não sem que me encha de encanto, e foi assim que numa cachoeira nas imediações da cidade me vi sem roupa e sem pudor nenhum beijando mulheres e homens na boca, beijo de língua numa ereção nunca antes tão prazerosa e profunda, não houve nenhum tipo de sexo mais comprometedor, mais naquele momento me ficou nítido que minha sexualidade não seria padrão. Como se tivesse morrido para alguma coisa e renascido para outra, muito mais forte que determinaria o que me restasse de vida daquele momento em diante.
            Não acredito em destino odeio a idéia de estar preso a uma determinação divina ou genética que seja, mas sou obrigado a admitir que determinados rompantes e desejos se manifestam com grandeza interior tamanha que ficamos impossibilitados de lutarmos contra eles.
            Naquele fim de tarde voltávamos daquela cachoeira, com um certo constrangimento pelo ponto de intimidade que havíamos atingido, mas por outro lado nos nutria uma sensação patriótica de dever cumprido. Conseguimos romper uma barreira de normas e padrões estabelecidos, por família, igreja e sociedade e, falo pelo menos por mim, quanto aos outros dois rapazes e as duas moças que estavam juntos, não posso e nem tenho o direito de avaliar se aquilo mudou suas vidas, mais arrisco um palpite, que aquele nosso fim de tarde em algum momento deve  enche-los pelo menos de nostalgia até hoje.
       Eu enquanto voltava para minha casa pensava em toda aquela sagração de sexo libertino, e quais pontos mais me excitavam dentro de tudo que ali foi posto em prática, lembrei a frase do Machado de Assis; Morri e não deixei o legado de minha miséria a ninguém.
        Senti ódio de toda formação familiar do mundo por que as pessoas não podem transar todas entre si? Isso sim seria amor irrestrito à humanidade, as crianças seriam de responsabilidade de todo mundo.
        Mas não perdi o senso de realidade continuava a trabalhar num banco e a morar na casa dos meus pais. Teria que me preservar, crescia dentro de mim um sentimento por liberdade de pensamento e sexo, que não poderia ser mostrado a qualquer um nem em qualquer lugar, pois eu sabia que poderia sofrer retaliações.
        Fui então aprendendo conviver com minha sombra como Dorian Gray, como o médico e o monstro, representando um papel no serviço e em casa e, vivendo o meu verdadeiro eu com os amigos da sociologia.
       Amargando a dor de ter que conviver com um mundo dividido por uma família onde as distancias e as diferenças se pontuavam por ganância e herança, e  um eu acovardado, não conseguia mostrar meus verdadeiros princípios.
        Sentia um louco desejo de ser como um padre, pastor ou guru embriagado em suas convicções e assim capaz de berrar aquilo tudo que se encontrava entalado na garganta sem temer o que pudesse ser dito ou pensado a seu respeito.
                    Consegui me esconder até o fim do meu curso, quando fiz uma viagem de carona para Machu Pichu com um casal de amigos abandonei o serviço no banco e tive a coragem de dizer a meus pais que não voltaria mais a morar com eles, pois queria viver livre de suas interferências, coisa que eu estava muito determinado e não mudaria de idéia.
                  Na viagem para o Peru enlouquecemos com as pessoas, lugares e principalmente com as situações, tudo nos elevava a um universo mágico, a paisagem, comida, danças e a música. 
                  Fui me apaixonando pelo casal durante a viagem como dormíamos sempre os três juntos era muito comum acordar no meio da noite com os dois transando na minha frente, tanto que numa certa noite me convidaram a participar de sua intimidade, isso foi dois dias antes de chegarmos em Machu Pichu, talvez a noite fria dos Andes tenha conspirado para essa união, a partir daí passamos a viajar pelas cordilheiras em direção ao Amazonas, sempre nos amando a três, no nosso trajeto fizemos amizades: com lideres indígenas, hippies, norte-americanos, seringueiros, traficantes, tomamos o chá da Aioascar, carona em  um jipe do exército com um militar que ficou impressionado com a gente e, nos apresentou a pescadores que nos levaram até Belém donde após fazermos amizade com um cara da aeronáutica (que ficou afins de transar com a gente) arrumamos uma carona num avião do correio para o Rio de Janeiro.
       O Rio nos oferecia uma grande comodidade, pois estávamos todos os três bem mais próximos de suas cidades em relação a distancia que já havíamos percorrido, e isso nos deu uma certa segurança que acabou nos desunindo sem que a gente percebesse.
            Ela passou a desconfiar que nós estaríamos transando sem sua presença ou que estivéssemos fazendo programa, coisas que até havíamos cogitado, mas que não tivemos coragem de fazer em respeito a esta moça que nos acompanhava, mas ela não teve sensibilidade para perceber o nosso amor e foi se tornando cada vez mais agressiva e inconstante, até que em um determinado momento se encheu; e voltou para Botucatu, selando assim nossa separação eu voltei para Marilia e Saulo ficou em Volta Redonda (Engraçado nunca mais tinha falado disso para ninguém)!
             E até hoje não consigo pronunciar nem meu nome nem o nome dela quando me refiro a essa nossa breve história. 
            A vida tem razões que só podem existir com a finalidade de nos enlouquecer mesmo, pois vejam só. Há duas semanas atrás eu os encontrei em um congresso de sociologia, eu já não os freqüentava há quase dez anos, e não sei o que me fez ir até aquele?
             E lá estávamos os três, eu sentia mais que nunca a necessidade de conversar, que rumo teria tomado a vida deles?
       Em pouco tempo fizemos para que pudéssemos os três juntos conversar, e para minha surpresa contaram-me com o que estavam trabalhando, durante esses quase 15 anos que não nos víamos( imaginei que tanto ela quanto Saulo, tivessem se enveredado para vida acadêmica tornando-se professores universitários, intelectuais de aulas e artigos)
          Mas para minha surpresa tanto Saulo como ela estavam dando consultoria em política e economia para banqueiros e empresários, e isto me fez sentir alegre por saber que estavam ganhando grana, mas por outro lado me decepcionou tanto fazendo com que eu me sentisse  mais traído por isso do que pelo fato dos dois terem casado e constituído família.
           Coisa que havíamos jurado os três que nunca faríamos, e neste momento senti quase um descontrole que me levou a uma veemência que não é sempre que consigo, dizendo:
            "Do que estou vivendo? Tenho um cargo no serviço público e dou aulas de Geografia em um colégio católico, coisas que estão bem distantes do significado de prazer e liberdade que sonhei para minha vida. 
          Sofro por padecer de um tipo de amor marginal, não sinto mais atração física pelas mulheres, os homens me perturbam e me excitam quanto mais velho fico, sobretudo os jovens.
              Confesso que tentei viver monogamicamente por duas vezes, com homens de pele clara intelectualizados, do nosso nível sócio-cultural, relações que acabaram  por causa da minha possessividade eu os sufoquei e eles foram embora, pelo menos era isso que eu imaginava.
           Mas só o tempo mesmo para me fazer enxergar certas coisas, sim por que hoje eu admito que após tanto tempo investigando as classes desfavorecidas, criou-se em mim (ou sempre existiu) um desejo carnal por  este extrato : estivadores, pedreiros, mecânicos, trabalhadores braçais de modo geral, foi isso que não permitiu que meus dois casamentos fossem pra frente. Não! Não é nenhum tipo de tara; É sim um amor incondicional a humanidade, que as religiões tanto falam, mas não conseguem por em prática. 
          A coragem de assumir seu amor àqueles que ninguém quer, mas, que carregam o mundo nas costas, que fazem o planeta girar com seu suor, que engravidam as meninas desprovidas e preteridas fazendo-nas se sentirem desejadas e queridas, os que são pau pra toda obra.
           Negrões, nordestinos, gabirus, dionisios da construção civil, apolos catadores de papelão, gabriéis garotos de programa, santos segurança privada, imaculados vendedores de churrasquinho, caridosos porteiros noturnos, generosos atores pornôs maridos de putas e travestis, deuses do meu kama sutra. Os únicos que deveriam ser verdadeiramente amados, as pessoas pela qual dedico a minha sociologia. 
           Seria um sonho poder dar consultoria sexual para todos essas pessoas e ainda ganhar algum com isso, eu acredito que alguém um dia consiga, e este sociologo terá se elevado à condição assim de uma espécie de cristo dos tempos atuais, ungido de corpo e alma"
           Eu consegui sair da infernal rotina de um banco, e me tornei sociólogo, e perambulando nas minhas noites, faminto, busco estes tipos humanos , já fui roubado, quase morto, mas a coragem consegui obter, não escondo mais o meu desejo me fortaleço e me rejuvenesço seguindo em direção ao próprio fim.
          Quem dera se fosse possível ter o poder e a lascívia dos vampiros da televisão.Só assim teria a imortalidade e força necessária de um herói para fazer a revolução das massas contra dominação secular das elites torpes, ainda mais hoje após a queda do muro de Berlim onde todo o mundo se rendeu à prostituição da ética da grana.
           O sonho da divisão da riqueza ruiu, se antes da queda do muro as profissões mais nobres eram de Filósofo, Historiador e Sociólogo.
          Hoje, elas são: Enfermeiro de pronto socorro, Depiladora de buceta e carpideira.


                                                                       Pedro Guimarães