Ela desde muito
cedo achava estranha seu segundo nome. Nome alemão que não era e não dizia
respeito a ninguém da sua família. Mas conviveu com aquilo toda a sua infância
e adolescência, mandada para colégio interno católico sentia a falta de algo
que identificava muito bem.
Aquele
ambiente repleto de mulheres se tornava um pouco menos tristonho quando alguma
irmã ou aluna tinha acesso de nervos e ela podia correr até a cozinha para providencialmente
trazer um copo de água com açúcar à flagelada.
Mostrando assim sua disponibilidade e
gentileza que sabia ter herdado de sua família, que embora brigassem “às vezes”
falando alto, eram provenientes do sul da Itália, sem nunca terem negado (apesar
de toda carolice mediterrânea) algumas idas a certo terreiro de umbanda logo
ali depois da Mooca.
Fato que ao
se tornar mais constante os familiarizou a tantos vizinhos negros e nordestinos
que nunca haviam até então notado.
Lívia Guertruda,
sim era esse seu nome, além de buscar água com açúcar para as descontroladas,
apreciava muito também momentos em que algo quebrava dentro do colégio, pois vinham
técnicos consertar o defeito. E eram homens.
Na sua doce inocência pensava: Homem parece
que resolve qualquer problema e não precisa sentar pra fazer xixi(embora os pelos
lhe dessem um certo asco) mesmo assim Deus havia sido mais generoso com eles.
Esse pensamento teria que ser guardado a sete chaves, não confidenciaria isso a
nenhuma freira ou amiga dali.
Com o passar
do tempo começou a questionar certas coisas: as vestes, os dogmas católicos, a
não presença de meninos na escola e a virgindade de Maria. Como engravidar sem
penetração? Era excelente aluna de biologia!
Depois do
seu primeiro menstruo revoltou-se, e foi a música que a amparou, quando
visitava a família nos finais de semana conseguia com os vizinhos fitas k7 com
rock inglês, samba-rock, forrozinhos maneiros ritmos que tornavam sua estadia
mais suportável naquele circo de horrores onde vivia e se educava.
Emancipada
foi estudar dança contemporânea com um papa desta modalidade aqui no Brasil. Alemão
enlouquecido que levava seus alunos ao extremo de radicalismos e
experimentações. Numa dessas aulas foi indagada por seu mestre sobre seu nome.
Lívia Guertruda. Havia alguma descendência germânica?
Ela, no entanto sem saber a explicação
da configuração
desta emblemática nomenclatura, pela primeira vez pergunta a sua mãe o porquê
desta escolha e ouve a resposta que transformou tudo que veio da aí pra frente.
Sua mãe
revela que Guertruda, não vem de nenhum resgate de referência ou origem
familiar; mas simplesmente pelo fato dela admirar muito uma freira alemã,
quando Lívia nasceu, que se chamava: Guertruda e, daí o nome em homenagem a
essa amiga.
A moça quase
teve um colapso, foi ela quem precisou de água com açúcar. Lembrou-se de todas
as privações que passou naquele colégio de freiras e de como as vezes lhe
incomodava certo temperamento sistemático e normativo que acreditava ser
herdado, e o tanto atrapalhador isso era nas suas experiências mais radicais
com a dança contemporânea.
Saiu andando
enfurecida por dias sem falar com a família, precisava se isolar e viver só a
dor de suas reflexões e com capacidade de superação que só tem os fortes, hoje,
tornou-se das mais requisitadas funkeira
inicialmente clamada como Irmã Guertruda,
mas com o tempo renomeou-se de “Mana Guerta”. Ameaçando todas as mulheres
frutas até o atual momento.
Gervásio
Pústula
Muito bom !!
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