sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Carnaval de razões

       

       Eram tempos loucos aqueles, pelo menos três vezes por semana o mesmo grupo ali, naqueles três bares em frente ao grande cinema de rua um dos poucos que não virou nem cine pornô, estacionamento ou templo evangélico.
      Ali se colocava a prova toda informação política, artístico-filosófica e boataria é lógico; O que seria da inte
ligência sem um pouco da boa e velha fofoca?
       Pelas razões mais diversas uns sumiam outros apareciam, era sempre surpreendente aquele lugar recheado de fatos, envolvido em relatos mais ou menos ortodoxos que asseguravam uma brisa hedonista de exercícios libertários muitas vezes bastante perigosos.
       Alguns daqueles conhecidos padeceram de doenças oportunistas, constrangedoras, teve gente até assassinada. Lembrando me estarreço mas nem eu nem tantos outros que fizemos dali nossa praça não nos arrependemos nem haveríamos disso.
       Encontrei Lavinho um dia desses, depois de muitas gargalhadas perguntei sobre Marquinhos. Um arquiteto pequeno, falante e serelepe que a gente sempre  cruzava naquele pedaço.
       Esse tal Marquinhos sempre me intrigou. Era sabido que pertencia a uma família rica ali de higienópolis ou Pacaembu, sei lá? O que sei é que o cara era bem maluco falava como um oligarca paulistano; sem perder um sentido estético bastante e humano com relação suas observações sem arrogância, poderia ser tão duro quanto qualquer um de nós, sabíamos da sua condição de burguês por que os entregadores de comida de um dos bares conheciam sua casa e família e nos relataram que se tratava de gente com muita grana.
       Conversei poucas vezes com ele; Mas sempre a conversa aconteceu repleta figuras de linguagens  e de imagens bastante agradáveis e engraçadas. O que me parecia curioso era o fato dele ter um tom de pele assim negro claro, uma coisa mulata, e ser da alta burguesia paulistana. Não nos habituamos nem a ver nem imaginar pessoas assim nestas condições.
       Nunca o indaguei com relação a sua cor. Seriam negros ancestralmente enriquecidos? Filhos ilegítimos ou adotivos da burguesia? Descendentes de estrangeiros? Golpistas? Nunca compreendi e principalmente nunca tive coragem de perguntar.
       O interessante era que Marquinhos tinha descontração e afabilidade mas também nutria um ar fidalgo de quem teve acesso a bons tratos e boa educação, inclusive quem nos apresentou foi o Lavinho que eu sabia que já tinha sido exportador de madeira para os Estados Unidos  e que depois de perder um grande amor, desencantou-se  do arrojo para os negócios vivendo já naquela época com conforto mínimo de dignidade modesta, e com as memórias de quando foi rico. 
       Um ex rico e outro rico ainda, que me tratavam com muito respeito e carinho, não posso reclamar sempre foi muito legal encontrar com os caras eu não sentia nenhum tipo de pedantismo da parte deles em relação a mim; Muito pelo contrário parecíamos crianças juntos. Tudo era motivo de risos e deboches. Nem a discussão política destoava nossas idéias e conceitos.
       Passaram-se então quase 10 anos e perdi os caras de vista as cidades foram se tornando mais opressivas, violentas e desgraçadamente proibitivas. Dessa forma fiquei super feliz quando reencontrei o Lavinho  alguns dias atrás e ele contou-me sobre o paradeiro do nosso outro amigo.
       Marquinhos há uns oito anos atrás foi passar um carnaval no Rio habituado como sempre, a viajar dentro e fora do país  em ocasiões de festas e feriados. mas este carnaval lhe tatuou a carne com uma doce cicatriz, conheceu uma pessoa no Rio durante as orgias de Momo.
       Perdeu o controle e o senso individualista que o protegia, trouxe essa criatura pra São Paulo levando-a até a casa herdada onde vivia com os irmãos no bairro nobre.
       Na mansão sem discrição ou pudor reuniu os irmãos( que segundo me disseram são todos muito parecidos com uma única mulher entre eles) se pronunciando.
        Disse que aquele ali seria seu homem, marido, amante e amigo que os irmãos aceitassem a condição que estava sendo posta; pois era sem bem estar e felicidade que estavam em jogo, pois nunca ele houvera seus vazios interiores preenchidos por algo tão longo e grosso como neste momento.
       Os irmãos reuniram-se em volta de marquinhos em silêncio se mostraram dispostos a rever antigos valores morais tão enraizados e contrários a tudo aquilo que o irmão lhes trazia. Então Marquinhos viveu a sensação de maior exito que podia ter sentido e inesperadamente como alento e acalanto se ofereceram para abraça-lo era o começo de uma nova história. Então começaram a  espancar marquinhos expulsaram seu consorte da casa da família e internaram Marquinhos numa clínica psiquíatrica. Ninguém nunca mais soube ou viu Marquinhos.


Pedrão Guimarães         

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