quarta-feira, 13 de junho de 2012

MARQUINHOS



                                        
Pobre marquinhos! Desde pequeno já percebiam, não sei se por maldade ou pura falação, que algo ali não havia se formado direito! Faltou algum tempero antes de fechar a panela, talvez um parafuso a menos na cabeça, qualquer coisa nesse sentido. Os vizinhos sempre percebem primeiro, parece que são assim para não verem o que acontece dentro da suas próprias casas.
 O menino trouxe luz e felicidade aquele lar. Filho de um casal que de tão velhos que eram acreditavam não mais serem capazes de gerar criança, e de fato já tinham idade avançada quando aquela gravidez despontou, em total estado de graça agradeciam a deus  abençoados por uma espécie de milagre bíblico, Dona Patrícia e seu Osmar  estavam aéreos de tanto  arrebatamento, pareciam rejuvenescidos quando o rebento surgiu.
Conforme o menino crescia a vizinhança na sua mordacidade já comentava que o menino não batia bem. Coisa que talvez nunca tenha sido verdade a não ser pela vontade destes vizinhos de elegerem uma criança no bairro, para ser o louquinho oficial.
 Não sei! Se marquinhos nasceu "tantan" , como comentam seus algozes ou; sucumbiu-se a situação por sugestão de tanta gente falando e torcendo para que isso acontecesse.
 Chegavam até a proibir as outras crianças de brincarem com o pobre, que foi crescendo só e cada vez mais isolado em si mesmo.
 Pouco subiu em arvore, não soltou pipa, não fez troca-troca mas aprendeu a andar de bicicleta e a manusear o computador, cresceu junto com o avanço da informática e esse era seu maior trunfo.
Nos conhecemos em um escritório na Santa Cecília, me assustava um pouco com ele mas era amigo e divertido, logo nos tornamos amigos.
 De uns meses para cá obstinou-se com a ideia de casar-se pois passou dos quarenta, vive dizendo que é uma preocupação constante aos pais, que já estão octogenários temendo a morte sem que Marquinhos esteja no conforto e segurança de sua própria família.
Ele então começa a pedir-me sugestões sobre possíveis parceiras, mulheres que ele conhece via internet, todas muito alvas, loiras e com um certo ar de "interesseiras". 
Não tenho coragem de falar muito,digo a ele apenas; que procure um outro perfil de mulher mais próximo da realidade.
E foi neste momento que ele, mesmo com toda a sua fragilidade, diluiu um veneno que eu não imaginava dele ouvir, disse-me:
"Fui criado pra me relacionar com gente de alta sociedade, papai e mamãe nunca me perdoarão se não me casar com mulher branca ,de cabelo liso e olhos claros, é a única possibilidade de ser bem sucedido,se não for assim é roubada"
Eu não acreditava no que acabava de ouvir, um sujeito exposto a todo tipo de assédio moral e discriminação, vomitando um papinho vagabundo deste.
 Fiquei na minha, me distanciei um pouco esfriando nossa amizade.
Algumas semanas mais tarde ,encontrei-o querendo brigar dentro de um bar cheio de "machos sem vergonha", pois enquanto ele tomava seu café com leite no balcão, um dos bêbados sugeriu que ele fosse "viado", tirei-o de dentro local caminhando com ele alguns quarteirões confortando-lhe repetindo várias vezes a seguinte frase:Não, você não é gay! 
Até que Marquinhos foi se acalmando partindo para sua casa.
Qual foi minha surpresa? Alguns dias atrás neste mesmo bar onde ofenderam Marquinhos, o balconista me contou que Marquinhos começou o namoro  com uma frequentadora de lá.
 Traveca, mulata, de cabelão (pintado de) loiro ,  moça que não se prostitui, trabalha na enfermagem e fala inglês.
 E o mais surpreendente, segundo o rapaz, Marquinhos disse que decidiu começar o namoro depois dos conselhos que eu havia lhe dado.
Senti-me uma espécie de sacerdote local, pregando no sentido de trazer luz e paz interior para intranquilos. Mas não me lembro de té-lo aconselhado a namorar travesti. 

                                    PEDRO GUIMARÃES

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